Frajola
Hoje, meus vizinhos se mudaram. As luzes da casa, apagadas. O varal, vazio. Não gosto, nem desgosto dos meus vizinhos. Nunca conversamos. As vezes, ouvia algumas conversas. Eles falavam alto.
Acho que mudaram de país. Não sei. Foi algo que ouvi nessas conversas. Talvez tenham ido para outra cidade. Uma vizinha lhes desejou "boa sorte". Tenho que quem muda de país precisa de mais sorte do que quem muda de cidade.
Devem ter levado o gato. Eu levaria o meu. Não gosto da ideia de ter um gato estrangeiro, miando com sotaque.
Já é a segunda vez que meus vizinhos, dessa casa, se mudam. Estranho. De alguma forma, a rotina sempre me acerta, como se ouvir a música que o outro escuta no rádio no sábado de tarde fosse gradativamente se tornando parte da minha própria experiência.
Não sei explicar. Não sou de muitas emoções ou sentimentos. Mas as despedidas me travam. Coisa que me acompanha desde menino. Detestava a escola, achava as outras crianças um pouco estúpidas, irritantes mesmo. Não gostava das brincadeiras dos meninos. Não assuntava com a meninas. Não gostava nem do sino do recreio, percursor do barulho caótico derivado da correria. Ficava na sala.
Mas, terminado o primeiro ano de escola, quando soube que a Professora do ano seguinte não seria mais a mesma, fiquei transtornado, angustiado, corroído. Firmei o plano de não voltar para a escola. Voltei. O problema não era a Professora. O problema é que as despedidas me põem mole como um diabo.
Antecipo a saudade — que nem sempre chega de verdade. O ato de se despedir é esquisito, porque é forma de se fazer sozinho. Uma coisa vai. Você fica. Ultimamente, tenho achado que a vida é despedida, isso me preocupa. Sou um saudosista.
Explico. Carrego comigo uma ausência que não sei explicar e ela fica mais enferrujada a cada vez que me despeço.